sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

A Obra de Arte uma energia em mutação


A propósito da exposição de escultura – Antologia breve - de Alberto Carneiro, recentemente inaugurada na galeria Árvore no Porto, suscitou-me uma reflexão, não de todo gratuita.
É precisamente sobre árvores, os “objectos” do artista e que aí se dão à fruição estética do público especialista, amante ou, tão-somente, sensível à arte, qualquer que seja, a expressão, o suporte ou o género.
Alberto Carneiro é, felizmente para nós, um artista incontornável da arte portuguesa das últimas décadas. Desde os anos sessenta que nos presenteia com obras da Terra, à Terra devolvidas como filhos saídos do ventre que lhes deu ser. “Um corpo íntegro e total”, assim o definiu Bernardo Pinto de Almeida comissário da exposição.
Interessante constatar que, acrescida à energia “mágica” que flúi em qualquer obra de arte, independentemente da sua materialidade, no caso das peças deste escultor, elas têm, efectivamente, uma energia telúrica intrínseca, sempre viva, sempre actuante, sobre o espaço e sobre quem está próximo. Pode-se falar de uma energia cósmica, universal, a que os chineses chamam Chi, os japoneses de Ki e os indianos de Pranna. Mas, independentemente da grafia do termo ou designação vocabular, a realidade é que cada vez mais nos tornamos conscientes da sua existência em nós e à nossa volta.
“Uma árvore nunca está morta. Ela pode já não dar castanhas, mas continua a mexer, continua a ser energia em mutação”. Que o diga o próprio artista para quem este processo de criação foi um longo período de quatro anos, “um longo namoro até surgir a obra”. Sobre esta energia em mutação em trocas mútuas – a obra emite, o artista recebe e devolve em criação de obra de arte. Esta, por sua vez oferece-se em prazer estético para quem a saiba fruir e, uma vez mais preenchido, também mais terá para dar, e assim sucessivamente -, ocorre-me pensar no dar e receber , lei universal da Dádiva, como bem explica Deepak Chopra*. Imperceptivelmente, mas sempre funcionando. Sempre que damos recebemos multiplicado e recebendo, logo nos capacitamos para mais dar. Uma troca tão natural que não deve parar nunca, sob risco de quebrar o fluxo ininterrupto de vida tal como o é o próprio acto de respirar: Impossível inspirar continuamente, como impossível é, continuamente expirar. Aqui se experiência o dar e receber básico.
Se um “simples” tronco de árvore continua vivo mesmo depois de decepado das suas raízes, desmembrado dos seus ramos e desprovido de alimento e de funcionalidade, como não reconhecer a energia que por ele perpassa e que o tornam em mais do que a sua matéria? O artista aqui em apreço soube aproveitar essa energia para a transmutar em obras de artes que agora podem ser visitadas no Porto.

[Sobre artigo de Andrade, Sérgio C. – “Alberto Carneiro explica porque é que «uma árvore nunca está morta»”, in Público 2, 11 Janeiro 2008, p. 8].
* Médico e eminente professor de Filosofia oriental é autor de vários bestsellers traduzidos em todo o mundo.


Bonnie

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